Arrependimentos da Vida Nômade

A divulgação do estilo de vida nômade digital cresceu muito neste último ano no Brasil e em vários outros países. Após um tempo de um novo estilo de vida é natural que as pessoas avaliem a mudança, o período, os acontecimentos e, claro, a continuação.

Nestes últimos dois meses, surgiram diversos posts de diferentes pessoas que o fizeram sobre a vida de nômade digital. O Tim Chimoy foi um dos primeiros que li com o post Digital Nomads: The dark side of freedom, onde ele relata algumas percepções. Antes disto, a Natália Becattini, do 360 Meridianos, já tinha comentado a respeito das Vantagens e Desvantagens de trabalhar na estrada em um post de agosto de 2015. Ainda sobre trabalho, o Adriano Castro do Viajei Bonito também fez um post bem bacana de Como lidar com as incertezas de um trabalho remoto. A Babi e o Vagner, do Melhores Momentos da Vida, também fizeram uma avaliação e contaram mais da experiência e batalha como nômades neste vídeo que eles compartilharam no Facebook. Também teve o post da Carolina e do Denny, do Na Palma do Mundo, que falaram sobre Desvantagens de ser nômade ou escolhas erradas?, aliás, nós concordamos muito com eles. E um último, bastante polêmico, foi o do Harald Baldr, Think You Can Handle Location Independence?, para citar alguns.

Nós já completamos um ano de estrada e trabalho e também fizemos nossa avaliação, e eu cheguei a conclusão que tenho muitos arrependimentos

Antes da avaliação, algumas considerações:

1) Sobre Ser Nômade Digital

Muitas pessoas ainda acham que ser nômade digital é simplesmente sair por aí, ficar em hostels, passar perrengue para conseguir um sinal de internet, trabalhar quando quiser e na maior do tempo curtir e passear. Elas estão muito enganadas!

Ser nômade digital requer planejamento (e não é pouco!). Planejar o destino que se adeque ao seu estilo, gosto e bolso, verificar questões de moradia, internet (fixa e via celular), conforto para trabalhar (sim! Você ficará muito tempo trabalhando!), segurança do local, além de ver se onde você ficará morando é perto de mercado, farmácia, onde é hospital de emergência próximo, como fazer para se deslocar com transporte público, analisar câmbio, como vencer a barreira de um idioma que você desconhece totalmente (e as pessoas do local desconhecem totalmente o seu!), entre outros detalhes para os mais precavidos. Tudo isto por termos que diminuir ao máximo o risco de errar na contração do aluguel da moradia, perder dinheiro e ficar em um destino sem eira nem beira.

Então, se é difícil para você planejar alguma coisa, pense bem antes de entrar neste estilo de vida, pois ser nômade digital exige muito planejamento.

Além disso, algumas imagens que se propagam por aí são irreais e enganosas. O pessoal da Na Palma do Mundo falou muito bem isto, como o ‘trabalhar com o notebook da praia’, ‘viver viajando’, entre outros pontos.

2) Saudades

Sim. Saudades é uma palavra frequente no vocabulário dos nômades. Ser nômade é também acumular saudades.

Saudades da família, dos amigos, do ambiente de trabalho em conjunto com colegas, do bichinho de estimação, de algumas coisas que você gosta e só encontra em determinado lugar, da paisagem conhecida, do português falado e escrito, enfim, saudades sempre existirão.

Saudades é um item que precisa ser gerenciado. Se você não aguenta ficar uma semana sem fazer um social, então, avalie bem sua escolha.

Chegar em um lugar novo, passar pouco tempo, precisar ter uma rotina de trabalho, estudo, conhecer os lugares interessantes e ainda fazer amigos é algo que pode ser bem trabalhoso. Ok que as redes sociais, seja os grupos de Facebook, Couchsurfing, ou outro ajudam bastante, mas é preciso dedicar tempo, além de falar razoavelmente bem inglês (pelo menos), para conseguir fazer amigos, pois não é toda hora que você vai encontrar um abençoado que fale português! Para salvar, há vários brasileiros espalhados pelo mundo e, procurando, sempre se encontra!

Quando a saudade aperta, vale ligação via whatsapp, skype, chat no Facebook, ou qualquer outro canal para dar um alô, saber como estão, as novidades, etc.

Mas quando a saudades é de um abraço da mãe, aí só visitando! E é o que fazemos.

3) Meu Cantinho

Tem muita gente que sente imensa falta do ‘seu cantinho’. Suas coisas, sua decoração, seu travesseiro, seu toque especial no lugar…

Eu sempre adorei minha casa, tentava deixa-la o mais agradável possível, do meu gosto, com meu jeito. Mas, aos poucos, fui percebendo que o ‘meu cantinho’ poderia ser qualquer lugar que eu estivesse bem. Um quarto confortável, uma cozinha com o mínimo de equipamentos para fazer aquele miojo com salada, um banheiro decente, um espaço agradável para trabalhar (pois ali passamos muitas horas no mês) e, quando possível, um local para descansar, como um sofazinho.

Encontrei diversos ‘meu cantinho’ pelo mundo. O apartamente de Lisboa, a casa de Mendoza, a de Saronida, o ap de Plovdiv e de Brasov. Precisa mais?

Para encontra-los passamos algumas horas olhando anúncios do Airbnb. Primeiro olhamos a cidade no geral e identificamos possíveis bairros que nos interessem (geralmente são os pontuação 5 estrelas no Airbnb). Depois, filtramos por internet (claro!), cozinha (que não pode faltar!) e o preço limite que podemos pagar (de acordo com nosso planejamento mensal). Quando possível, já selecionamos os Super Hosts também, que sabemos por comentários de outros viajantes que são anfitriões com boa comunicação, de confiança, qualificados e que ofereceram uma boa experiência aos hóspedes.

Após os filtros, vamos lendo toda a descrição que o host faz do local e também todos os comentários de quem já ficou no local. Depois disto, sobram três ou quatro opções. Selecionamos a melhor no nosso entendimento e enviamos mensagem ao host. Se ele aceitar, pronto! Nosso cantinho já está escolhido. E, felizmente, até hoje não erramos!

4) Minhas Coisas

Você já parou para pensar o que seriam “minhas coisas” para você?
Até quanto você está disposto a carregar peso para levar suas coisas com você?

Pois bem. Este item é bastante interessante para uma reflexão.

Quando comecei a viajar, beeem lá antigamente, minha mala era gigantesca. Carregava de tudo. Se duvidar tinha até ração de coala!

Com o tempo, você vai vendo o que usa e o que não usa, itens dispensáveis e itens extremamente necessários e a mala vai reduzindo… reduzindo…

Hoje tenho uma mochila de 13 kg e outra menor de 5 kg, onde cabe tudo o que eu preciso na minha vida. Desde roupa, acessórios, produtos de higiene à notebook e máquina fotográfica. Ok que carrego alguns itens que acho um luxo, mas eu não dispenso, como secador de cabelo, e alguns itens que são conforto para evitar dores, como meu travesseirinho de viagem. Mas, no total, ‘minhas coisas’ reduziram bastante e reduzirão ainda mais na próxima mala que fizer.

Interessante ver como o desapego modifica as pessoas…

Por trabalho, a única coisa que não posso ficar sem é o notebook (por enquanto!). Isto de fato acarreta prejuízos para mim e para meus clientes. Portanto, ‘minhas coisas’ é o meu notebook atualmente. O restante dos ‘bens’ é surpérfluo, substituível e sem valor sentimental.

Uma das coisas que ainda terei que ver como carregar é nossa barraca, saco de dormir e isolante térmico e minha coleção de imãs de geladeira, que hoje atravancam a casa de minha mãe…

5) Rotina (ou a falta dela)

Na vida nômade a rotina é algo difícil de manter. Os outros nômades já falaram disso, mas vou deixar aqui minha opinião também.

Alimentação

Alimentação muda muito, pois em cada país encontramos particularidades, não encontramos vários ingredientes, marcas mudam muito (e o que era bom fica ruim), mesmo o pãozinho básico do café da manhã é infinitamente diferente em todos os lugares e não existem muitas padarias como as brasileiras… Isto tudo sem falar dos pratos e quitutes típicos! Isto faz com que manter uma alimentação regrada e balanceada seja tarefa complicada. Mas, não é ruim.

Conhecemos tantas coisas diferentes que o paladar e os gostos pessoais nunca mais serão os mesmos. Sentirei saudades eternas da Salada Grega, do Iogurte Búlgaro (ou Iogurte Grego, pois eles estão sempre brigando pela ‘autoria’ do melhor iogurte do mundo!), da Carne Argentina, da Linguiça Alheira de Portugal, do Presunto com Melão Espanhol… entre tantos outros sabores do mundo.

Exercícios Físicos

Frequencia e regularidade de exercícios fisicos é tarefa quase impossível! Há tanto para ver de novo na cidade que quando se sai não é para ir ao mesmo lugar, fazer a mesma coisa (no caso exercícios). Então, estes acabam por ser longas caminhadas para curtir a cidade na qual se está morando e também, no nosso caso, trilhas quando elas são possíveis.

Vou ser sincera: esta mudança constante gera muito cansaço, físico e mental. Mas, não é por isto que ela é ruim.

No dia-a-dia tentar manter uma rotina básica é importante sim, até para não enlouquecermos tanto em termos de trabalho e saúde. Mesmo com as mudanças, tentamos minimizar estes fatores e levar a vida o mais saudável e ‘normal’ possível.

6) Trabalho Digital

Quando se trabalha sozinho, se é chefe de si próprio e impõe sua própria rotina, disciplina é fundamental.

Muitas pessoas reclamam da falta de produtividade no trabalho digital levando uma vida nômade. Aí, entra de novo o planejamento. É preciso programar seus dias e seu final de semana com maior antecedência de quando se tem uma rotina definida por horários rígidos ou compromissos fora de casa.

Hoje consigo me programar bem para sair passear em uma quarta-feira ensolarada, enquanto que em algum sábado chuvoso vou trabalhar. É questão de disciplina, organização e programação. E nisto até a previsão do tempo entra!

Obviamente, tem dias terríveis de trabalho, período que você só consegue pensar no sol lindo lá fora e vários pontos turísticos incríveis para conhecer, mas você programou que naquele dia você ia trabalhar até tarde, marcou reuniões e prometeu entregas… mais normal impossível.

Como todo empreendimento próprio, a produtividade, o crescimento, o desenvolvimento do negócio se baseia, única e exclusivamente, na sua competência, na sua determinação e, principalmente, na sua dedicação! Nada vem fácil! É muito esforço envolvido, são muitas horas de trabalho, muito cansaço de final de dia, mas tudo é recompensado em um outro momento incrível conhecendo um lugar que você sempre quis!

Arrependimentos da Vida Nômade

Bem, agora vem a avaliação, os arrependimentos, que afinal deveriam ser o principal deste post. Eles não são muitos, mas poderiam ter feito toda a diferença na minha vida.

Pois bem, aí estão listados:

Arrependimento 1: Não ter me tornado nômade digital antes.

Arrependimento 2: Não ter economizado para poder usufruir de mais tempo livre agora.

Arrependimento 3: Não ter me dedicado mais a praticar inglês.

Arrependimento 4: Não ter estudado programação web.

Arrependimento 5: Não ter aprendido russo, nem alemão.

Arrependimento 6: Não ter estudado finanças e investimentos.

Arrependimento 7: Não ter saído da chamada ‘zona de conforto’ muito antes, pois é fora dela que as coisas incríveis acontecem!

É preciso saber que, como tudo na vida, há os bônus e os ônus, ou seja, as partes boas e as ruins, os momentos felizes e os de estresse, as vitórias e os fracasos; e é preciso gerenciar tudo isto, minimizando riscos e maximizando os prazeres.

A lição disto tudo?

“Nossas limitações são impostas por nos mesmos”.

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